Fim Do Sonho
Mal o dia amanheceu e ele já estava de pé. Estava frio e escuro. Levantou-se e foi direto à cozinha fazer o café. O almoço já estava feito desde ontem à noite, acondicionado na marmita e colocado dentro do forno para manter a temperatura. A mulher e os filhos continuaram dormindo.
Pegou a marmita, o guarda-chuva e os bilhetes da condução e partiu para mais um dia de trabalho. Era mestre de obras na construção de um prédio de 40 andares, com todos os requintes de luxo, piscina quente e fria, adulta e infantil, churrasqueira, solarium, sala de ginástica, biblioteca, discoteca, salão de festas e de jogos, sauna, e um tanto de outras coisas mais, que mal conhecia ou já ouvira falar. Também, para esse tipo de edifício, um apartamento por andar, com 400 metros quadrados de área, tinha que ter mesmo todas essas parafernálias que só os abastados podem possuir.-Pensava ele.
Andou cerca de 500 metros para pegar o ônibus que o levaria até a obra. De sua casa até o trabalho gastava uma hora e trinta minutos. De segunda a sexta ele fazia esse percurso duas vezes ao dia. Aos sábados trabalhava de pedreiro fazendo bico para os vizinhos. Afinal, sua fama de bom profissional já chegara à redondeza.
Aquele dia de chuva e frio transcorria normalmente como todos os outros. A segurança checada, precauções advertidas...Estava tudo normal, não fosse a triste fatalidade daquela tragédia que abalou a todos os operários do canteiro de obras, e particularmente o encarregado, seu chefe e amigo.
Às 10 horas e 30 minutos, um andaime carregado de tijolos e cimento despencou do 12º andar, atingindo em cheio a cabeça de Severino, um ajudante “meia-cuié” na gíria da construção, que morava no próprio local, e no momento do acidente estava preparando a massa para o assentamento de pisos no apartamento que serviria de amostra aos futuros compradores.
Todos correram na tentativa de salvar o humilde operário que havia deixado a mulher e dois filhos no sertão do Piauí para tentar vida nova em São Paulo, fugindo da seca e da fome. Lá não tinha emprego e nem perspectiva de melhoria de vida. frente de trabalho aberta pelo governo para a construção de açudes não fora suficiente para empregar todo mundo. Tinha gente de mais e emprego de menos. O jeito foi arrumar as malas, pegar o ônibus e partir em busca de nova vida. Afinal ouvira falar que em São Paulo se ganhava muito dinheiro e tinha trabalho pra todo mundo.
Lá ficaram, a esposa e os dois filhos, menores de idade: William e Wellington, de dois e três anos, respectivamente.
Cícero, amigo e conterrâneo do Piauí e colega de acampamento não continha as lágrimas que lhe caiam sobre o rosto transtornado e molhado de suor.
- Que coisa horrível, meu Deus,que tragédia, repetia a todo instante, indo e vindo de um lado a outro do local onde estava o corpo.
-Como o Severino não viu o andaime vindo em sua direção! – Será que ele não ouviu o barulho dos cabos deslizando sobre a torre de madeira? Questionava-se aterrorizado!
– Meu Deus, meu Deus, exclamava a todo instante. Mas nada pode fazer.
O resgate foi acionado e os para-médicos, salva-vidas do corpo de bombeiros, nada puderam fazer pelo coitado que jazia moribundo sobre o chão frio e úmido, entre destroços de construção.
Às 20 horas seu corpo foi levado para o Instituto Médico Legal, para autopsia.
Cícero, a pedido do mestre de obras acompanhou tudo e incumbiu-se de transmitir à família a triste tragédia. Imaginava um modo de como a sua mulher sem lhe causar traumas ou maiores sentimentos. Não tinha como fazer...Na casa de Severino não tinha telefone, aliás na vila inteira ninguém tinha. O jeito foi mesmo ligar para o posto telefônico local e pedir para alguém ir até a casa de Dona Zuleide, avisá-la para estar ás 21 horas na telefônica, que Severino, seu esposo, queria falar com ela.
Às 21 horas em ponto Cícero telefonou e disse que Severino não pudera vir e pediu-lhe que desse o recado. Mas, Zuleide, desconfiada não acreditou e começou a chorar questionando Cícero sobre o que havia acontecido, já que na noite passada ela tivera um pesadelo em que via inerte sobre o chão o corpo do marido.
Cícero não se conteve, como também, não pôde esconder o acidente. Em prantos, contou-lhe e disse que o corpo de Severino estava sendo enviado para ser sepultado. Em seguida desligou o telefone.
À noite, na solidão do acampamento, sem a presença do companheiro e amigo, Cícero imagina-se voltando para sua terra natal com dinheiro no bolso, o suficiente para comprar algumas rezes e uma pequena roça onde pudesse plantar e colher alguns grãos, sustentar a família e viver feliz. Sonho que Severino também sonhou sem tempo de realizar. Foi o fim de tudo, de João, José ou Severino, qualquer deles, cidadãos brasileiros.
J.Miranda Filho
Janeiro 2007.
Pegou a marmita, o guarda-chuva e os bilhetes da condução e partiu para mais um dia de trabalho. Era mestre de obras na construção de um prédio de 40 andares, com todos os requintes de luxo, piscina quente e fria, adulta e infantil, churrasqueira, solarium, sala de ginástica, biblioteca, discoteca, salão de festas e de jogos, sauna, e um tanto de outras coisas mais, que mal conhecia ou já ouvira falar. Também, para esse tipo de edifício, um apartamento por andar, com 400 metros quadrados de área, tinha que ter mesmo todas essas parafernálias que só os abastados podem possuir.-Pensava ele.
Andou cerca de 500 metros para pegar o ônibus que o levaria até a obra. De sua casa até o trabalho gastava uma hora e trinta minutos. De segunda a sexta ele fazia esse percurso duas vezes ao dia. Aos sábados trabalhava de pedreiro fazendo bico para os vizinhos. Afinal, sua fama de bom profissional já chegara à redondeza.
Aquele dia de chuva e frio transcorria normalmente como todos os outros. A segurança checada, precauções advertidas...Estava tudo normal, não fosse a triste fatalidade daquela tragédia que abalou a todos os operários do canteiro de obras, e particularmente o encarregado, seu chefe e amigo.
Às 10 horas e 30 minutos, um andaime carregado de tijolos e cimento despencou do 12º andar, atingindo em cheio a cabeça de Severino, um ajudante “meia-cuié” na gíria da construção, que morava no próprio local, e no momento do acidente estava preparando a massa para o assentamento de pisos no apartamento que serviria de amostra aos futuros compradores.
Todos correram na tentativa de salvar o humilde operário que havia deixado a mulher e dois filhos no sertão do Piauí para tentar vida nova em São Paulo, fugindo da seca e da fome. Lá não tinha emprego e nem perspectiva de melhoria de vida. frente de trabalho aberta pelo governo para a construção de açudes não fora suficiente para empregar todo mundo. Tinha gente de mais e emprego de menos. O jeito foi arrumar as malas, pegar o ônibus e partir em busca de nova vida. Afinal ouvira falar que em São Paulo se ganhava muito dinheiro e tinha trabalho pra todo mundo.
Lá ficaram, a esposa e os dois filhos, menores de idade: William e Wellington, de dois e três anos, respectivamente.
Cícero, amigo e conterrâneo do Piauí e colega de acampamento não continha as lágrimas que lhe caiam sobre o rosto transtornado e molhado de suor.
- Que coisa horrível, meu Deus,que tragédia, repetia a todo instante, indo e vindo de um lado a outro do local onde estava o corpo.
-Como o Severino não viu o andaime vindo em sua direção! – Será que ele não ouviu o barulho dos cabos deslizando sobre a torre de madeira? Questionava-se aterrorizado!
– Meu Deus, meu Deus, exclamava a todo instante. Mas nada pode fazer.
O resgate foi acionado e os para-médicos, salva-vidas do corpo de bombeiros, nada puderam fazer pelo coitado que jazia moribundo sobre o chão frio e úmido, entre destroços de construção.
Às 20 horas seu corpo foi levado para o Instituto Médico Legal, para autopsia.
Cícero, a pedido do mestre de obras acompanhou tudo e incumbiu-se de transmitir à família a triste tragédia. Imaginava um modo de como a sua mulher sem lhe causar traumas ou maiores sentimentos. Não tinha como fazer...Na casa de Severino não tinha telefone, aliás na vila inteira ninguém tinha. O jeito foi mesmo ligar para o posto telefônico local e pedir para alguém ir até a casa de Dona Zuleide, avisá-la para estar ás 21 horas na telefônica, que Severino, seu esposo, queria falar com ela.
Às 21 horas em ponto Cícero telefonou e disse que Severino não pudera vir e pediu-lhe que desse o recado. Mas, Zuleide, desconfiada não acreditou e começou a chorar questionando Cícero sobre o que havia acontecido, já que na noite passada ela tivera um pesadelo em que via inerte sobre o chão o corpo do marido.
Cícero não se conteve, como também, não pôde esconder o acidente. Em prantos, contou-lhe e disse que o corpo de Severino estava sendo enviado para ser sepultado. Em seguida desligou o telefone.
À noite, na solidão do acampamento, sem a presença do companheiro e amigo, Cícero imagina-se voltando para sua terra natal com dinheiro no bolso, o suficiente para comprar algumas rezes e uma pequena roça onde pudesse plantar e colher alguns grãos, sustentar a família e viver feliz. Sonho que Severino também sonhou sem tempo de realizar. Foi o fim de tudo, de João, José ou Severino, qualquer deles, cidadãos brasileiros.
J.Miranda Filho
Janeiro 2007.
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